Manifesto

Exmo. Senhor Ministro do Ambiente e Ação Climática, 

Doutor Duarte Cordeiro,

Vimos, por este meio, expressar a nossa inquietação face à intenção governamental de construir um túnel para desviar as águas da Albufeira do Cabril até à localidade de Belver, que apenas se situa a 30 quilómetros a montante do local onde o rio Zêzere já desagua, conjuntamente com a intenção de destruição de um Rio livre, o Ocreza, com a construção de mais uma barragem falsamente vendida com fins ambientais.

Somos autarcas, empresários e habitantes da região envolvente à Albufeira do Cabril, à Albufeira de Castelo de Bode e ao Rio Ocreza e não podemos permitir que qualquer intenção, projeto ou construção prejudique a natureza e a vida do nosso território. A natureza é o nosso bem mais precioso e não consentimos na sua degradação com soluções que nos parecem desprovidas de razoabilidade. 

Compreende que vivemos tempos de apreensão com um futuro cada vez mais instável devido às alterações climáticas. Fenómenos como o que atualmente vivemos, de períodos de seca, altas temperaturas e escassez de recursos hídricos, serão cada vez mais recorrentes e intensos, pelo que não nos permitem aceitar a construção do túnel e de mais barreiras à circulação da água. Estas são soluções do passado que foram responsáveis por nos trazer este futuro instável, sendo necessárias novas abordagens.

Consideramos que as obras de engenharia por Vós anunciadas trarão consequências nefastas quer ao reduzir os níveis de água a jusante do Cabril e, assim, impactar a biodiversidade ainda existente, quer ao nível socioeconómico, uma vez que a degradação da paisagem e natureza atentam contra as atividades económicas existentes na região, como o turismo, que tanta importância tem no sustento das famílias.

Neste momento, a Albufeira do Cabril encontra-se à cota de 30%, impossibilitando muita da atividade turística que nestes meses é motor económico da região. Situação também vivida na Albufeira do Castelo de Bode onde, por exemplo, a maioria das estâncias de Cable Park de wakeboard estão desativadas devido ao baixo nível da água da Albufeira. Com o desvio da água do Cabril ficará menos água disponível para estas duas albufeiras, o que tornará mais recorrente a gravosa situação atual.

A destruição de mais um rio livre, ao contrário do que apregoam, nunca trará benefícios ambientais. Com 59% dos moluscos e 40% dos peixes de água doce na Europa sob ameaça de extinção, o governo português, em contraciclo com as políticas europeias de promoção de Rios livres, continua a defender a construção de mais barreiras nos nossos Rios como “benefícios ambientais”.

Procuramos que nos sejam apresentados atempadamente os projetos técnicos das mencionadas infraestruturas e a análise do seu impacto ambiental, económico e social. Desejamos que auscultem a população destes territórios antes de iniciar qualquer obra e que a informem devidamente sobre as implicações a curto e longo prazo destes projetos. 

Relembramos que não é de interesse nacional nem de interesse local, o desenvolvimento de uma obra, com um avultado custo monetário, que não cumpra eficientemente o seu propósito. Preocupa-nos o dispêndio de enormes quantidades de dinheiro público em soluções que não se revelam funcionais nem eficazes na resolução da progressiva escassez de recursos hídricos e que se revelam especialmente prejudiciais no nosso território.

Desafios do futuro não se resolvem com soluções do passado. Os problemas de regularização dos caudais do rio Tejo provocados pelas barragens em Espanha resolvem-se nas barragens espanholas e não com a construção de novas barreiras. Será imprescindível a revisão da Convenção de Albufeira e a exigência do seu cumprimento pelo país vizinho. No futuro, sendo a água um bem precioso cada vez mais escasso, é crucial que o seu consumo seja reduzido e que haja uma adaptação do seu uso na agricultura, com reaproveitamento de águas residuais, redução de perdas e eficiência no seu uso. 

Se no futuro nos espera menos água, apelamos à sua ponderação e equilíbrio na procura de soluções que não impactem negativamente a nossa natureza nem a vida das nossas populações.